Quando comer deixa de ser apenas comer: um olhar junguiano sobre transtornos alimentares
- Thálita Borges
- há 6 dias
- 3 min de leitura

Comer é, à primeira vista, um ato simples e necessário para a vida. Mas, para muitas pessoas, a relação com a comida se torna um território de conflito, controle, culpa e sofrimento. Em vez de nutrir, alimentar-se passa a ser uma forma de lidar com emoções, preencher vazios, expressar angústias ou exercer domínio sobre o próprio corpo.
Sob o olhar da psicologia junguiana, os transtornos alimentares não são apenas questões comportamentais ou biológicas. Eles são expressões simbólicas da psique — formas de a alma comunicar algo que não encontrou palavras. Por trás de uma compulsão, de uma restrição severa ou da obsessão pelo corpo, há histórias não contadas, emoções não digeridas e imagens internas clamando por escuta.
Neste artigo, vamos explorar os transtornos alimentares como manifestações simbólicas da alma, compreendendo como a psicoterapia pode ser um caminho de reconexão com o corpo, com os afetos e com o que verdadeiramente nutre.
Quando a comida carrega um significado que vai além
Para a psicologia analítica, sintomas não surgem por acaso. Eles têm uma função: chamar atenção para algo que precisa ser olhado, vivido e transformado. Com os transtornos alimentares, não é diferente.
Quando alguém sofre com anorexia, bulimia, compulsão alimentar ou outras dificuldades com a alimentação, é comum que o foco se concentre no corpo e no comportamento. Mas, muitas vezes, o sintoma está ligado a questões emocionais profundas, como:
Sentimentos de inadequação ou vazio existencial
Necessidade de controle em um mundo interno caótico
Dificuldade em lidar com emoções intensas ou traumáticas
Feridas relacionadas à autoimagem, autoestima e identidade
Experiências de crítica, abandono, rejeição ou exigência
O corpo, nesse contexto, torna-se o palco onde essas emoções se expressam. Comer demais, comer de menos, purgar ou restringir não são apenas atos físicos — são linguagens simbólicas da alma tentando encontrar um modo de ser ou de pedir ajuda.

A escuta simbólica da alma
Na abordagem junguiana, o trabalho terapêutico não se limita a eliminar o sintoma. Ele busca compreender o que está por trás da dor: o que essa relação com a comida revela sobre a história da pessoa? Que imagens internas estão associadas ao corpo? Que emoções estão sendo sufocadas ou projetadas no alimento?
Exemplos práticos do olhar simbólico:
Uma mulher que, ao restringir alimentos, também está tentando reprimir sua raiva — uma emoção que aprendeu desde cedo que não poderia sentir.
Um homem que come compulsivamente sempre que se sente sozinho, porque a comida passou a simbolizar afeto, segurança e presença.
Alguém que purga após comer, como forma de "expulsar" algo que sente que é inaceitável ou impuro dentro de si.
Essas manifestações não são fraquezas ou falta de força de vontade. Elas são tentativas inconscientes de lidar com conteúdos psíquicos complexos. A psicoterapia junguiana oferece um espaço de escuta para esses símbolos, promovendo integração entre mente, corpo e emoções.
O papel da psicoterapia no processo de cura
Tratar transtornos alimentares requer sensibilidade, tempo e uma escuta profunda. Na psicoterapia junguiana, o processo envolve:
Acolher a dor e o sintoma sem julgamento
Explorar os significados simbólicos da alimentação e do corpo
Trabalhar os afetos reprimidos ou distorcidos
Reconectar-se com o próprio valor e identidade além da aparência física
Construir novas formas de se relacionar com a comida e com a vida
Muitas vezes, os sonhos trazem imagens importantes sobre a relação com o corpo, com a nutrição ou com figuras internas que exercem pressão ou crítica. Os mitos e contos também ajudam a nomear processos inconscientes, oferecendo novos sentidos para aquilo que parecia apenas sofrimento.
A relação com a comida pode ser, sim, um reflexo de uma fome mais profunda — de afeto, pertencimento, expressão ou reconhecimento. Transtornos alimentares falam de dor, mas também de uma busca por sentido. E é possível transformar essa dor em caminho de cura, reconexão e crescimento.
Algumas sugestões para iniciar esse processo:
Observe sua relação com a comida com curiosidade, não com culpa.
Pergunte-se o que você realmente está tentando alimentar ou controlar.
Anote seus sonhos, imagens e sensações corporais. Eles são pistas valiosas.
Busque ajuda profissional especializada. O caminho não precisa ser solitário.
Você sente que sua relação com a comida carrega algo que precisa ser ouvido?
Se sim, a psicoterapia pode ser um espaço acolhedor e transformador para esse processo.
Estou aqui para te acompanhar com sensibilidade, escuta profunda e respeito à sua jornada.